domingo, 24 de dezembro de 2017

Coisas sobre Hollywood que você não sabia!

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Da era de ouro do cinema mudo às atuais super produções, a indústria cinematográfica de Hollywood permanece a mais lucrativa no setor de serviços nos Estados Unidos. Embora o faturamento das bilheterias venha declinando nos últimos anos — foi de cerca de US$ 11 bilhões em 2016 para aproximadamente US$ 9,7 bilhões em 2017, segundo o Statista, 13% dos americanos ainda vão ao cinema todo mês. A seguir, veja curiosidades históricas e conheça segredos sobre como funciona a indústria.


1 - Hollywood queria “americanizar o mundo”: quando executivos da Costa Leste se mudaram para Los Angeles para criar os primeiros sete estúdios (Paramount, Universal, MGM, Twentieth Century-Fox, Warner Brothers, Columbia e RKO) no início do século 20, eles convenceram o presidente americano na época, Woodrow Wilson, de que se tratava de uma indústria essencial para solidificar a imagem dos Estados Unidos no exterior. Wilson criou um serviço dedicado à exportação de filmes, e declarou: “Filmes são um dos meios mais importantes para a disseminação de inteligência pública e, por falarem uma linguagem universal, são essenciais para a apresentação dos planos e propósitos americanos.”

2 - Em 1947, anos de ouro de Hollywood, existiam mais cinemas do que bancos nos Estados Unidos. Em média 90 milhões de americanos, mais da metade da população que na época tinha 151 milhões, iam aos cinemas em uma semana qualquer.

3 - Branca de Neve e os Sete Anões, da Disney, foi primeiro filme na história do cinema a alcançar a marca de US$ 100 milhões em vendas de bilheteria.

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4 - Existem cerca de nove mil roteiristas membros do Sindicato dos Roteiristas dos Estados Unidos e mais de 16 mil diretores membros do Sindicato dos Diretores dos Estados Unidos. Extraoficialmente, porém, o número ultrapassa os 100 mil.

5 - A maioria dos roteiros nunca é, de fato, produzida. Segundo uma estimativa da Paramount, nove de cada dez projetos em desenvolvimento no estúdio nunca recebem carta verde para produção.

6 - Poucos atores conseguiram um negócio tão bom quanto Arnold Schwarzenegger na sequência da franquia O Exterminador do Futuro 2. Embora seus filmes mais atuais tivessem sido fracassos de bilheteria, e ele estivesse com quase 60 anos no momento de gravação do filme, seu nome havia se tornado tão associado à imagem do personagem que sua participação no projeto foi considerada essencial. Como consequência, o estúdio concordou em pagar US$ 29,5 milhões por 19 semanas de trabalho, além de permitir que ele aprovasse o diretor, os outros atores do filme e o roteiro. Ao todo, foram 18 meses de negociações.

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7 - Mesmo com todos os avanços tecnológicos, computação gráfica abocanha uma fatia considerável do orçamento de filmes e podem custar mais do que os gastos com os próprios atores. Em Godzilla, por exemplo, quase US$ 10 milhões foram gastos para criar os monstros.

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8 - As trilhas sonoras são igualmente caras. A Paramount, por exemplo, chegou a pagar US$ 1 milhão para poder usar a música “I Disappear”, do Metallica, em Missão Impossível II.


9 - Para os donos de cinema, o maior negócio não são os filmes, e sim a pipoca. Com pouco milho, é possível encher muito saquinhos, e mais: os clientes vão ficar com sede e querer refrigerante. Há estimativas de que os cinemas lucrem 90 centavos para cada dólar vendido em pipoca. Não à toa, um dono de cinema teria dito que as cadeiras com espaço para colocar um copo foram “a melhor invenção tecnológica desde o som”.
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10 - Um “truque” muito utilizado por roteiristas para tornar seus personagens mais simpáticos ao público é o momento de “salvar o gato”. Termo cunhado por Blake Snyder em seu livro “Save the Cat”, é aquele momento do filme em que o mocinho ou mesmo o vilão faz algo positivo, como dar um sorvete para uma criança aleatória na rua, que nos faz gostar do personagem.

11 - A indústria quer o mesmo… Mas diferente. Sabe aquela impressão que às vezes temos de que todos os filmes, no fundo, são parecidos? Eles de fato são! A verdade, como diz Snyder em “Save the Cat”, é que a maioria das ideias centrais de filmes já foram feitas de alguma forma. Snyder as classifica em seis: monstros, histórias mitológicas, mágicas, “um cara com um problema”, ritos de passagem, histórias de amor, o porquê de um crime, o bobo que triunfa, sagas familiares e super-heróis. O que os produtores e estúdios buscam é um novo ângulo para recontar essas histórias.




(Fontes: The Big Picture - Money and Power in Hollywood, Edward Jay Epstein (2006); Save the Cat - The Last Book on Screenwriting That You’ll Ever Need, Blake Snyder (2005).)

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Qual é o remédio mais perigoso do mundo?



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“Uma amiga minha tomava o remédio, para um problema de dor, e me falou sobre ele. Resolvi experimentar. A sensação foi maravilhosa, como um orgasmo incrível. Eu me sentia anestesiada e muito feliz. No começo, tomava um comprimido por dia. Daí passei a tomar dois, três e hoje preciso de uma caixa inteira para conseguir o mesmo efeito. Se não tomo, passo mal demais. Fico com muita dor no corpo, tremedeira e uma diarreia horrível. Para conseguir o remédio, vou a um pronto-socorro e finjo que estou com muita dor. Se o médico não me dá, falsifico a receita. São coisas que eu jamais pensei em fazer. Mas a dependência é incontrolável. Tento parar e não consigo.”

Essa é a história de uma recepcionista de 35 anos que mora em São Paulo. Ela se viciou em oxicodona, um remédio produzido por vários laboratórios e vendido com nomes diversos (os mais comuns são OxyContin, OxyFast e Percocet). É um analgésico semissintético parcialmente derivado de uma espécie de papoula, a flor usada para fazer ópio e heroína. Por isso, esse medicamento e seus similares naturais, como a morfina, são conhecidos como opioides.

Eles variam na potência, mas têm os mesmos efeitos: anulam qualquer tipo de dor física, provocam uma curiosa mistura de relaxamento e euforia e são extremamente viciantes. Tanto que, só nos Estados Unidos, 2 milhões de pessoas são dependentes deles, segundo dados do governo americano. É uma quantidade assombrosa de gente, o dobro do número estimado de viciados em crack no Brasil. Os opioides também matam – e muito. Só no ano passado, causaram 60 mil mortes nos EUA (incluindo as do cantor Prince e da atriz Carrie Fisher, a princesa Leia de Star Wars). É mais do que todas as vítimas de acidentes de trânsito e armas de fogo, somadas. Também é mais do que os mortos por aids no pico da epidemia de HIV, em 1995. Um problema tão gigantesco que, em agosto, o governo dos EUA classificou os opioides como “emergência nacional” e prometeu medidas para dificultar sua venda.

Mas como um remédio tão perigoso pôde chegar ao mercado e ganhar versões cada vez mais potentes, sem que ninguém fizesse nada? A resposta é surpreendente – porque é quase tão antiga quanto a própria humanidade.

Do Neolítico às farmácias
Em 3.400 a.C., os sumérios já extraíam um suco branco e leitoso da papoula, que chamavam de “planta da alegria”. Tumbas egípcias do século 15 a.C. contêm vestígios da substância, usada num ritual de sedação para o sonho eterno. Gregos e romanos também usavam a substância. Na Odisseia, Homero fala sobre uma tal nepente, a que ele se refere como “droga do esquecimento” – na verdade, um coquetel de ópio.
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Papoula, de onde é extraído o ópio.

Com o tempo, o narcótico ganhou usos medicinais. No século 2, o médico grego Galeno o recomendava para curar coisas tão distintas quanto asma, epilepsia, tristeza e pedras nos rins. No século 16, o alquimista suíço Paracelso misturou a droga com álcool, almíscar e âmbar para criar um elixir contra tosse, insônia, dor e diarreia – o láudano –, que era vendido nas farmácias sem receita até o início do século 20. Claro que nem todos os usuários tinham problemas de saúde. Muitos só queriam se divertir. Os chineses, por exemplo, gostavam de fumar ópio. E viraram os maiores consumidores do mundo, inclusive porque foram forçados a isso.

No século 18, a Inglaterra importava cada vez mais seda, chá e porcelana da China, pagando a conta com ouro e prata. Mas, como não tinha um produto de exportação para equilibrar a balança, a sangria só aumentava. A solução foi o ópio. Os ingleses produziam a substância na Índia e vendiam para os chineses. Mas ela fez tanto estrago que acabou proibida pelo imperador. Então os ingleses se aliaram a traficantes, que levavam a droga escondida. Deu muito certo: o consumo chegou a 2.500 toneladas por ano, com 12 milhões de chineses viciados. O problema levou a duas guerras entre China e Inglaterra, ambas vencidas pelos britânicos. A dinastia Qing foi obrigada a abrir os portos e engolir a legalização do ópio. De quebra, perdeu Hong Kong.

Apesar disso, ninguém sabia explicar de onde vinham os poderes da papoula. O alemão Friedrich Sertürner matou a charada: no começo do século 19, ele conseguiu isolar o princípio ativo da planta e o batizou de morphium – alusão a Morfeu, o deus grego dos sonhos. A morfina se encaixa nos chamados “receptores opioides”, que estão presentes em várias regiões do cérebro e normalmente são ativados pelos analgésicos naturais, produzidos pelo próprio organismo, como a endorfina. Ela funciona do mesmo jeito – só que é muito mais forte. Friedrich testou-a em cobaias e em si próprio. Sentiu euforia, náuseas e depressão. Ficou assustado e advertiu: “É meu dever chamar a atenção para os terríveis efeitos dessa nova substância.”

Ninguém deu bola. Na década de 1820, a morfina já era sucesso de vendas na Europa e nos EUA, graças ao baixo custo e à ação potente. “Pela primeira vez, os médicos podiam prescrever doses precisas”, escreve o britânico Martin Booth no livro Opium: A History (sem versão em português). De lá para cá, a indústria farmacêutica foi desenvolvendo analgésicos opioides cada vez mais fortes. Entre eles, a oxicodona, que foi criada por cientistas alemães em 1917 e usada para anestesiar soldados feridos na 1a Guerra Mundial.

Os opioides sempre tiveram seus riscos. Mas a medicina sempre conseguiu utilizá-los com certa segurança para tratar casos de dores graves, como as causadas por câncer, grandes queimaduras ou traumatismos. Nesses casos, eles continuam a ser indicados. “Se a medicina indica, os opioides devem ser usados, sim”, diz o psiquiatra Danilo Baltieri, professor da Faculdade de Medicina do ABC e especialista em dependência química.

Nem todo mundo que toma um opioide vai se viciar. Basta que ele seja prescrito e usado com cautela. Só que, a partir da década de 1980, isso mudou – graças a um tremendo mal-entendido.


Como a papoula é cultivada e processada.


1. A plantação
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Plantação de Papoula.

2. A colheita
O agricultor seca e mói as flores, que se transformam num pó. Esse pó é vendido para laboratórios farmacêuticos.

3. O processamento
O laboratório extrai uma substância, a paramorfina (também conhecida como tebaína), do pó. Ela não é analgésica.

4. A transformação
A paramorfina é misturada com acetato de sódio, tolueno e peróxido de hidrogênio. Após uma série de reações químicas, ela vira oxicodona: o princípio ativo dos analgésicos opioides.

5. A montagem
A oxicodona é misturada com excipiente (pó inerte) e prensada no formato de comprimidos. O laboratório pode incluir outras substâncias na fórmula, como naloxona (que reduz a potência do opiáceo).

Para tudo e para todos
Em 1980, o médico Hershel Jick, da Universidade de Boston, teve a ideia de fazer um estudo sobre os analgésicos usados em hospitais. Ele avaliou os registros de 11.882 pacientes que haviam sido tratados com opioides – e constatou que apenas quatro deles haviam se viciado nesses remédios. Uma porcentagem baixíssima: 0,03%. “Nós concluímos que, apesar do amplo uso de narcóticos em hospitais, o desenvolvimento de dependência é raro”, escreveu em seu artigo científico. O trabalho de Hershel passou batido até 1986, quando foi citado na revista médica Pain, da Sociedade Americana de Dor. Daí tudo explodiu. Médicos, cientistas e – claro – laboratórios farmacêuticos começaram a usar os dados de Hershel para dizer que os opioides não eram perigosos e podiam ser receitados numa boa para diversos tipos de dor.

Por essa lógica, todo mundo que tinha algum tipo de dor crônica (não só os pacientes com casos graves) poderia tomar esses remédios. A imprensa logo embarcou na história e publicou uma série de reportagens exaltando a segurança e a eficiência daqueles produtos maravilhosos. Nos anos 1990, uma nova doutrina começou a ganhar força entre os médicos: em vez de apenas reduzir a dor crônica, como até então se fazia, o ideal era acabar com ela. Afinal, se existem analgésicos tão eficientes, e aparentemente tão seguros, por que não?

Só que todo mundo ignorou o óbvio: o estudo do Dr. Hershel era sobre pacientes internados, que recebiam doses rigidamente controladas dos remédios. Uma situação completamente diferente de pegar uma caixinha na farmácia. Ninguém sabia como as pessoas iriam se comportar quando pudessem levar aqueles medicamentos para casa e tomar o quanto quisessem. Começava, ali, a epidemia que iria espalhar viciados pelo mundo – inclusive no Brasil.


“Nós temos visto cada vez mais casos. Em geral, são problemas gravíssimos”, diz o psiquiatra Arthur Guerra, coordenador do Programa de Álcool e Drogas da Faculdade de Medicina da USP. “As pessoas imaginam que só o crack destrói as pessoas. Mas os dependentes de opioides também chegam destruídos ao consultório”, confirma Danilo Baltieri. A pessoa deixa de trabalhar e estudar e passa a viver em função do remédio, chegando a cometer crimes para conseguir dinheiro e comprar o medicamento. Em alguns casos, também são viciados em outras substâncias. “Antes do OxyContin, eu já bebia”, diz Fabiana. Sua voz tremia enquanto ela falava com a SUPER. É que, no dia da entrevista, ela tinha tomado menos comprimidos do que de costume, na enésima tentativa de parar. Fabiana é tratada por um médico que aceitou apresentá-la à SUPER, com a condição de que a identidade da paciente fosse preservada.

Em 2007, a Justiça dos EUA entendeu que o fabricante do OxyContin enganou os médicos, pois subestimou os riscos do remédio, e condenou a empresa a pagar uma multa de US$ 634 milhões. Mas isso não foi o suficiente para frear a escalada dos opioides nos Estados Unidos. Ela alcançou o auge em 2012, quando os médicos americanos assinaram 289 milhões de receitas desses remédios. De lá para cá, com a pressão contra os opioides, o consumo caiu um pouco. Mas se mantém elevadíssimo: no ano passado, foram 245 milhões de receitas, o equivalente a uma caixinha de remédio para cada adulto do país. “Nós estamos na era dos comprimidos, e é difícil dizer não a pacientes desesperados”, diz o americano Ethan Nadelmann, fundador da ONG Drug Policy Alliance. “Também há médicos que não sabem tratar a dor, nem têm tempo para os pacientes. É mais simples receitar um comprimido”, afirma. Essa situação é agravada pelos planos de saúde, que preferem pagar por remédios a sessões de fisioterapia ou RPG (reeducação postural global), que são mais caras, mas poderiam resolver muitos dos casos de dor crônica. E pelos laboratórios também, já que eles têm interesse em lançar e vender novos analgésicos.

Com a queda nas vendas de opioides nos EUA, os fabricantes estão se voltando para outros países – entre eles, o Brasil. Nosso mercado é um filão largamente inexplorado, pois os médicos brasileiros não têm o costume, como os americanos, de receitar indiscriminadamente esse tipo de remédio (segundo a Sociedade Brasileira para Estudos da Dor, que reúne médicos especialistas no tema, o Brasil é um dos países com menor consumo de opioides per capita).

No ano passado, o laboratório Mundipharma, que produz o OxyContin, patrocinou um seminário no Rio de Janeiro. Tema: dores crônicas, e o uso de opioides para tratá-las. Foi um evento restrito a médicos, mas um repórter do jornal Los Angeles Times, que estava investigando a expansão internacional do OxyContin, teve acesso ao conteúdo. Um momento chama a atenção: a Mundipharma teria dito aos médicos presentes que 80 milhões de brasileiros sofrem de dor crônica.

E a semente de papoula?
No Brasil, o cultivo da papoula é proibido pelo Ministério da Saúde. Mas você consegue encontrar, em lojas de culinária, saquinhos de semente de papoula: um ingrediente que pode ser usado em bolos, biscoitos e pães caseiros, e também adicionado a saladas e molhos. Essas sementes não contêm nenhuma substância entorpecente (o ópio é produzido com a flor da papoula, não com as sementes). Elas são importadas, e só podem entrar no Brasil se o comerciante provar que não possuem capacidade germinativa, ou seja, são estéreis (para isso, basta torrar as sementes). Se você tentar plantá-las, não nascerá nenhuma flor.

Se você aplicar a mesma lógica adotada pelos médicos americanos (de que toda dor crônica pode e deve ser tratada com opioides), inevitavelmente chegará a uma conclusão: esse é o mercado potencial, no Brasil, para esse tipo de remédio. 80 milhões de pessoas.

 “Segundo uma pesquisa encomendada pela Mundipharma, 15% a 40% dos brasileiros sentem algum tipo de dor crônica, de vários tipos”, afirma Nestor Sequeiros, presidente da empresa. Isso significa, então, que seria correto dar OxyContin em todos esses casos? “Somente o médico pode avaliar a necessidade de cada paciente”, diz.

Também foi perguntado à empresa se receitar o remédio para milhões de brasileiros não poderia acabar detonando uma epidemia de viciados, como nos EUA. “Embora a situação fora dos EUA seja muito diferente, com pouco abuso de medicamentos, nós apoiamos os esforços para minimizar esse risco no Brasil”, diz Sequeiros.

A Mundipharma (que pertence à família americana Sackler, dona de uma fortuna de US$ 13 bilhões) reconhece que o abuso de opioides pode causar dependência e morte, e diz que investe em treinamento para médicos e no desenvolvimento de tecnologias de segurança. O próprio OxyContin já tem um mecanismo do tipo: ele libera a oxicodona aos poucos, o que em tese diminuiria o risco de overdose. Na prática, não foi o suficiente para evitar problemas.

Diferentemente de outros medicamentos com ação psicoativa, como ritalina ou Rivotril, o OxyContin não é tarja preta. Ele é vendido com tarja vermelha, a mesma usada para remédios bem mais corriqueiros. A Anvisa diz que isso não compromete a segurança da população, pois o OxyContin só é vendido mediante apresentação de receita de controle especial em duas vias, uma das quais fica retida na farmácia. Mas, diferentemente do que acontece com os medicamentos tarja preta, cuja receita é impressa num papel amarelo especial, a receita da oxicodona é um papel sulfite branco preenchido com os dados do médico – coisa que viciados no medicamento, que como a recepcionista no início do artigo, conseguem falsificar.

A próxima geração
Enquanto o Brasil entra na mira do OxyContin, os laboratórios farmacêuticos preparam os sucessores dele. Em 2014, chegou ao mercado americano o mais polêmico: o Zohydro, dez vezes mais potente que os outros. É tão forte, mas tão forte, que apenas dois comprimidos já podem levar à morte (para crianças, basta um). A Food & Drug Administration (FDA), que regula os medicamentos nos EUA, não queria deixar o produto chegar ao mercado – seus conselheiros votaram, por 11 a 2, contra o lançamento dele. Sob pressão, a agência acabou liberando o remédio alguns meses depois. Ele é produzido pelo laboratório americano Alkermes – que também vende o remédio Vivitrol, para tratar viciados em opioides.

Neste ano, pela primeira vez a FDA tirou do mercado um opioide, o Opana ER. Ele tinha um mecanismo de segurança: liberava seu princípio ativo lentamente, ao longo de 12 horas. Por isso, não dava “barato”. Pelo menos em tese. Os usuários descobriram que bastava amassar o comprimido e inalar o pó para ter a mesma lufada de prazer. Então seu fabricante, o laboratório Endo Pharmaceuticals, reformulou a droga: revestiu a pílula para impedir que fosse esmagada. Mas os viciados logo aprenderam como tirar a proteção e injetar o pó do remédio na veia. Muitos compartilhavam as agulhas – o que causou um surto de HIV nos Estados Unidos.

Enquanto a epidemia rola solta por lá, o alarme começa a soar no Brasil. “Um sinal de que o uso de opioides é um problema aqui são as chamadas ‘populações escondidas’, que não participam das grandes pesquisas”, diz Danilo Baltieri, da Faculdade de Medicina do ABC. É o caso de anestesistas, enfermeiros e cirurgiões, que têm acesso a medicamentos potentes. “O uso de opioides está aumentando nesses grupos”, afirma. “Também cresce o uso entre pessoas que já têm dependência de alguma droga e querem experimentar novas”, diz Arthur Guerra, da USP.

O vício em opioides é tratado com metadona: um opioide sintético mais leve, que alivia os sintomas de abstinência provocados pela falta do medicamento. O problema é que a pessoa adquire um novo vício, em metadona – que é menos agressiva, mas também pode ser um problema. E nem sempre funciona. “Eu comecei a fazer tratamento com metadona, mas não melhorei”, afirma a recepcionista.

Os opioides são tão viciantes que, nos Estados Unidos, o cerco a eles fez com que muitos usuários migrassem para drogas ilegais, como a heroína (nome popular da diamorfina, um opioide derivado da papoula). Tanto que o número de mortes por heroína quase quadriplicou por lá desde 2010. “Hoje, 80% dos novos usuários de heroína começaram nos analgésicos opioides, prescritos por um médico”, diz Nora Volkow, diretora do Instituto Nacional Contra o Abuso de Drogas (NIDA), dos EUA.

E o mercado ilegal tem se mexido para atender à multidão de viciados. Um dos novos produtos é uma mistura de heroína com fentanil – um opioide sintético, que não leva papoula na composição, mas é cem vezes mais potente que a morfina. Bastam 2 miligramas desse coquetel para matar. Foi o que aconteceu em junho com o menino Alton Banks, de 10 anos. Ele não resistiu após ter contato (não se sabe como) com uma mistura de fentanil com heroína. Em maio, o policial Chris Green quase morreu após vistoriar um carro de traficantes. Ele passou a mão na camisa para limpar um pó branco – que era fentanil com heroína. Acabou inalando uma quantidade ínfima do produto suspenso no ar, e só sobreviveu após tomar quatro injeções de naloxona, um antídoto. Nos EUA, as mortes por por esse remédio (tanto o oficial quanto o ilegal, misturado com heroína) dobraram no ano passado.

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Carfentanil
Mas nada se compara ao carfentanil, que é 10 mil vezes mais potente do que a morfina e já matou algumas centenas de pessoas nos EUA e no Canadá este ano. Seus criadores estavam fazendo experiências com a estrutura molecular do fentanil, nos anos 1970, mas acabaram criando algo forte demais. Tanto que o carfentanil nunca foi liberado para uso em seres humanos. Só pode ser vendido para uso veterinário – em elefantes. Ele é tão potente que os EUA temem que seja usado como arma química. De certa forma, os opioides já estão sendo – na farmácia mais próxima de você!







Fonte: Eduardo Sklarz e Bruno Garattoni/Super





segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

A Internet Agora Vai Ter Dono!

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Serão eles os donos da Internet?

Como você talvez saiba, a Federal Communications Commission, a Anatel dos EUA, decidiu acabar com a chamada “neutralidade da rede”: princípio que obrigava os provedores de internet a tratarem igualmente todos os dados, sem poder discriminar ou privilegiar nada do que passa por suas redes. Os deputados e senadores americanos, que trabalharam a favor da medida, receberam mais de US$ 100 milhões em doações das empresas de telecomunicações, as grandes beneficiadas dessa história (não é só no Brasil, veja você, que corporações compram as graças dos políticos). O fim da neutralidade é a maior mudança da história da internet – que, ao longo dos próximos anos, poderá se transformar em algo radicalmente diferente. E não para melhor.


Porque, a partir de agora, as telecoms passam a ser donas da internet. Elas decidem o que cada pessoa poderá acessar, como e quantas vezes fará isso. E, ao exercer esse poder, controlam o destino da rede. Suponha, por exemplo, que você tenha uma cota de dados para usar durante o mês – como já acontece nos planos de celular, e as telecoms desejam fazer com a banda larga fixa. Só que determinados sites e apps não contam, ou seja, você pode usá-los à vontade sem descontar da sua franquia de dados. De quebra, eles abrem muito mais rápido. É lógico que você irá acessar esses sites e apps, e não outros. E isso tem uma consequência econômica óbvia. As empresas de internet que fizerem acordos com as telecoms, pagando o que elas pedirem (e obedecendo às condições que elas impuserem), irão prosperar; as outras, definhar e sumir.

Mas que mal tem isso?, você pode perguntar. Afinal, vivemos no capitalismo, e as telecoms têm direito de cobrar pelo uso das suas redes, nas quais investiram dezenas de bilhões de dólares. Gigantes como Google, Facebook, Amazon e Netflix têm dinheiro de sobra para pagar. Do outro lado, os usuários que quiserem adquirir novos tipos de acesso à internet (como uma conexão que priorize a velocidade dos vídeos, por exemplo) terão acesso a eles. E assim, pela magia da liberdade econômica, a inovação florescerá e todos sairão ganhando. 

Na prática, não será bem assim. Por um motivo simples: o setor de telecomunicações é naturalmente concentrado. Quantas empresas oferecem banda larga na sua rua? Uma, duas, provavelmente no máximo três. Com o celular acontece a mesma coisa, não? É assim porque os investimentos necessários para construir as redes são muito altos, e porque a própria infraestrutura limita o número de players (o espectro eletromagnético só comporta um determinado número de operadoras; os postes das ruas, certa quantidade de cabos). Com poucas empresas competindo, cada uma se torna desproporcionalmente poderosa. Foi por isso que, no começo de 2015, os EUA criaram regras para garantir a neutralidade da rede – um ano depois do Brasil, que em 2014 fizera o mesmo ao aprovar o Marco Civil da Internet. A legislação americana acaba de cair; a do Brasil, bem como a de outros países, deve seguir o mesmo caminho.

E a tendência, como em todos os setores econômicos, é que a concentração aumente. Sabe quando você vê, no noticiário, que duas grandes empresas se fundiram ou uma comprou a outra? Só no ano passado, foram mais de 7.000 fusões e aquisições entre grandes empresas, com valor combinado de US$ 2,4 trilhões. É provável que, daqui a alguns anos, existam ainda menos empresas de telecomunicações do que hoje – e as que sobrarem sejam ainda maiores. 

Google, Facebook, Amazon e Netflix vão fazer acordos com as novas donas da internet. Uns se conformarão em ter menos lucro, outros repassarão o gasto aos usuários (nós). Mas continuarão funcionando, talvez até melhor. O problema é que, daí para a frente, qualquer aplicativo, site ou serviço que for inventado estará imediatamente em desvantagem – porque seus criadores não conseguirão dar tanto dinheiro às telecoms quanto os quatro gigantes. E as pessoas não conseguirão acessar, e usar, aquele app ou site da mesma forma.

Para as startups, a única maneira de sobreviver e ter sucesso será se aliar a um dos quatro. O tráfego (e o faturamento) da rede, que nos últimos anos já foi ficando altamente concentrado, será mais concentrado ainda. Num segundo momento, as telecoms começarão a absorver os próprios produtores de conteúdo, como sites e empresas jornalísticas, num processo de hiperconsolidação (que já está começando nos EUA). Medidas que hoje soam absurdas, como vetar acesso a certas coisas ou restringir a navegação a pacotes de conteúdo, como numa assinatura de tv a cabo, se tornarão plausíveis. Algum tempo depois, serão a norma.

E a internet, que foi projetada para ser imune a qualquer tentativa de controle, terminará nas mãos de meia dúzia de empresas. A rede global descentralizada e indestrutível, criada para resistir até a uma guerra nuclear, terá sucumbido a algo mais prosaico: o desarranjo nas relações entre a política, o dinheiro e o poder.




Fonte: Bruno Garattoni/Super




domingo, 17 de dezembro de 2017

A diferença entre ser professor no Brasil e na Finlândia!


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Neste exótico país em que a polícia não pratica tiro ao alvo com professores, a sistemática política de valorização do magistério produz resultados capazes de espantar até um pitbull da PM: a carreira de professor na Finlândia tornou-se uma das principais preferências entre os jovens, à frente de profissões como medicina, direito e arquitetura.

“O magistério na Finlândia é uma carreira de prestígio”, diz o professor Martti Mery na escola finlandesa Viikki, que também funciona como um centro de treinamento de professores vinculado à Universidade de Helsinque.

“A profissão possui um alto status em nossa sociedade, que tem grande respeito e consideração pelos professores”, ele acrescenta.

A invejável cultura finlandesa de dignidade profissional dos docentes e respeito ao professor foi forjada na revolução educacional conduzida pela Finlândia a partir dos anos 70, que alçou o país para as posições mais elevadas do ranking mundial de desempenho escolar.

A transformação que se produziu incluiu um fator de relevância especial: o nível de excelência dos professores. Todos os programas de formação de professores, que anteriormente eram realizados fora do âmbito do ensino acadêmico superior, foram levados para dentro das universidades, todas elas gratuitas. Mais: obter um mestrado tornou-se a qualificação básica e obrigatória de um professor para poder ensinar nas escolas finlandesas – mesmo na educação pré-escolar.

“No fim dos anos 70, a formação dos professores finlandeses passou a constituir um programa de mestrado com cinco anos de duração, que se dá portanto nas universidades do país. Desde então, gradualmente cresceu entre os professores o sentimento de pertencer a uma categoria profissional altamente educada e prestigiada”, diz o educador finlandês Pasi Sahlberg, um dos arquitetos do chamado milagre finlandês.

A exigência do grau de mestre para os docentes foi uma medida significativa da reforma educacional, observa Sahlberg.

“Isso não só elevou toda a categoria dos professores como profissionais, como passou a dar a eles um profundo conhecimento sobre os mais recentes avanços da pesquisa em suas respectivas áreas de ensino”, ele diz.

Outro aspecto crítico para o sucesso do modelo finlandês foi o desenvolvimento de uma relação de respeito com o professor, e de boas condições de trabalho nas escolas. Como, por exemplo, uma divisão equilibrada do tempo em que um professor necessita trabalhar dentro e fora da sala de aula.

É esta, dizem os finlandeses, a melhor forma de atrair profissionais jovens e talentosos para a carreira de professor nas escolas públicas.

“A experiência finlandesa mostra que o principal é garantir que os professores sejam tratados com dignidade, a fim de que possam concretizar o objetivo de escolher o magistério como a carreira de uma vida inteira”, diz Pasi Sahlberg.

Cursos de doutorado para professores também são disponibilizados, gratuitamente, nas universidades do país. O Estado finlandês investe ainda cerca de USD 30 milhões a cada ano para o desenvolvimento profissional de professores e diretores de escola, através de cursos universitários e programas de reciclagem.

Foi assim, e não tratando professores como bandidos, que os finlandeses criaram uma legião permanente e aplicada de candidatos ao magistério no país.

A carreira de professor tornou-se uma das mais competitivas do país.


A mídia finlandesa divulga regularmente resultados de pesquisas sobre as preferências dos estudantes do ensino secundário, que sistematicamente apontam o magistério entre as profissões mais desejadas.

A cada primavera, milhares de jovens se candidatam a uma vaga para estudar nos departamentos de formação de professores das universidades da Finlândia.

Mas apenas os melhores e mais preparados estudantes podem se tornar professores na Finlândia: no exigente sistema finlandês, apenas cerca de 10% dos candidatos são em geral aprovados para cursar o obrigatório mestrado na universidade.

“A carreira de professor é extremamente popular aqui na Finlândia. Mas os exames de admissão são competitivos a tal ponto, que chegam a intimidar os candidatos. Por isso, nem todos os estudantes que desejam seguir o magistério chegam a se candidatar, por medo da reprovação”, diz Niklas Nikanorov, do Ministério da Educação e Cultura finlandês.

Em 2014, diz Nikanorov, apenas 8,9% dos 7.469 candidatos ao curso de formação de professores da Universidade de Helsinque foram aprovados. No mesmo ano, 1.597 estudantes candidataram-se ao curso de medicina da instituição, e 11,7% foram aceitos.

Sim, é isso mesmo: na Finlândia, o magistério é mais popular que a medicina.

“Do total de 139 mil estudantes universitários em todo o país, mais de 10% estudam ciências educacionais”, acrescenta Niklas Nikanorov.

Para realizar o sonho de se tornar um professor, um jovem finlandês deve ser dono de um robusto currículo escolar – além de obter excelentes notas na prova nacional de conclusão do ensino secundário, e também no exame prestado especificamente para a candidatura ao curso universitário, com perguntas focadas em um amplo conjunto de tópicos educacionais.

Na segunda fase de seleção para o acesso à universidade, os candidatos mais bem colocados da etapa inicial passam por uma série de entrevistas para explicar, por exemplo, porque decidiram se tornar professores. No final, só entram os melhores.

Conquistado o diploma, o professor vai receber um bom salário – mas que se situa dentro da média salarial do país como um todo (3,284 euros, segundo a agência nacional de estatísticas da Finlândia). E na igualitária sociedade finlandesa, assim como na Escandinávia em geral, as diferenças entre os salários não costumam ser exorbitantes.

O salário médio de um professor primário finlandês é de 3,132 euros mensais (cerca de 11,8 mil reais). Professores do ensino médio recebem 3,832 euros, e docentes de universidades ganham em média 4,169 euros por mês (15,7 mil reais).

Vamos comparar: um “käräjäoikeustuomari” (juiz de primeira instância) na Finlândia recebe em média 5,797 euros mensais (cerca de 22 mil reais). Um engenheiro ganha 4,577 euros. Um médico, 7,296 euros. Uma enfermeira, 3,488 euros. O diretor-executivo de uma empresa, 6,755 euros em média.

Um deputado federal brasileiro entraria talvez em estado comatoso ao descobrir o valor do salário de um parlamentar finlandês: 6,355 euros mensais (aproximadamente 24 mil reais) – mas sem direito a verbas indenizatórias ou penduricalhos extras. Isso para viver em um país caro que possui uma das mais elevadas cargas tributárias do mundo, onde o cidadão paga cerca de 51,5% de impostos sobre sua renda.

No Brasil, além do salário de R$ 33,7 mil, um parlamentar recebe ainda o chamado cotão (média de R$ 33.010,31), verba de gabinete para até 25 funcionários (R$ 78 mil) e variados benefícios extras, como ajuda de custo, auxílio-moradia e plano de saúde cinco estrelas. Os privilégios se multiplicam ainda mais na esfera da Justiça, em que o dinheiro dos impostos do cidadão chega a bancar uma obscena Bolsa Educação para pagar escolas particulares para filhos de juízes do Rio de Janeiro.

Enquanto isso, os professores brasileiros estão entre os educadores mais mal pagos do mundo – segundo apontou em 2014 o ranking internacional divulgado pela OCDE a partir de dados dos 34 países membros da organização e dez parceiros, incluindo o Brasil.

O valor do piso salarial dos professores brasileiros: R$ 1.917,78. Para professores da rede pública com diploma de licenciatura no início da carreira, o salário-base médio é de R$ 2.711,48 (excluindo gratificações).

No resto do mundo, países como a Suíça, a Holanda e a Alemanha pagam salários mais altos aos professores do que a Finlândia, apesar de registrarem índices mais baixos de desempenho escolar. No estudo da OECD, a Finlândia aparece em nono lugar na lista dos países que melhor pagam seus professores.

Qual seria então a principal motivação de uma pessoa para se tornar um professor na Finlândia?

“Respeito”, responde o professor Martti Mery, da escola Viikki.

Tal é a confiança nos mestres, que não existe nenhum tipo de avaliação formal do desempenho de professores na Finlândia. O sistema nacional de inspeção escolar, que antes exercia esta função, foi abolido no início dos anos 90.

“Controlar o desempenho do professor não é uma questão relevante na Finlândia. A premissa básica é de que os professores são, por definição, profissionais altamente educados que realizam o melhor trabalho possível nas escolas”, diz o educador finlandês Pasi Sahlberg.

Entregar a liderança do sistema a profissionais da educação também é parte da fórmula do milagre finlandês, observa Pasi Sahlberg.

“Discordamos da visão de que a melhor forma de desenvolver a educação é colocar o controle das escolas nas mãos de administradores sem experiência no setor, na esperança de que um gerenciamento de estilo empresarial vá elevar a eficiência. Na Finlândia, todas as autoridades do setor de educação estão, sem exceção, nas mãos de educadores profissionais”, ele destaca.”

A taxa de sindicalização da categoria é uma das mais altas do mundo: 95% dos professores finlandeses são filiados ao poderoso Opetusalan Ammattijärjestö (OAJ), chamado de “A Voz dos Professores”.

“O modelo finlandês mostra que a colaboração com sindicatos de professores, e não o conflito, produz melhores resultados. As evidências são claras, e é este o caminho a seguir”, diz Pasi Sahlberg, que hoje atua como professor visitante da Universidade de Harvard.






Fonte: Claudia Wallin.

BitCoins - Os perigos por de trás dessa nova febre!


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Há um fenômeno fantástico ocorrendo no jornalismo brasileiro na última semana: virou mania falar das tais Bitcoins. Nesse período, não houve um dia sequer em que nenhum dos canais de TV abordasse o tema.

O motivo desse despertar não é a sede pelo conhecimento nem o bom jornalismo econômico – muito pelo contrário, aliás. O motivo desse despertar é a valorização explosiva dessa moeda virtual, que apenas na última semana foi de 22,8%. O cheiro do dinheiro fácil sempre atrai igualmente especuladores e jornalistas no mercado financeiro.

A superficialidade com a qual esse tema está sendo apresentado ao brasileiro é preocupante. Se até ontem a Bitcoin era apenas um fetiche hacker a ser operado por monitores verde-fósforo, hoje ela se tornou o centro de uma corrida do ouro maluca, uma “oportunidade de investimento” igual a qualquer outra operação financeira.

Enquanto o JN exalta a valorização da Bitcoin em 1.794% em menos de um ano e o SBT Brasil mostra os métodos para quem quer se juntar à onda, a realidade cada vez mais tóxica desse tipo de transação sequer aparece nas reportagens.

O aspecto pantanoso foi denunciado mais recentemente pelo economista Joseph Stiglitz, ganhador do Prêmio Nobel de Economia, à rede americana Bloomberg. Em entrevista, afirmou: “A Bitcoin não serve a nenhuma função socialmente útil, e sem nenhum tipo de regulação por parte do governo, deveria ser proibida. Seu único motivo de sucesso vem de seu potencial para contravenções, falta de fiscalização”.

Stiglitz faz parte de um grupo cada vez maior de economistas preocupados com o futuro das “criptomoedas” – uma ideia genial, em teoria, mas que já indica ser um desastre social na prática. Entender a ideia por trás da febre, mais do que uma boa prática de finanças pessoais, é um dever para quem deseja participar do debate.

Mas o que são, afinal, “criptomoedas”?

A Bitcoin é um “criptomoeda” inventada por um internauta (ou grupo) cujo pseudônimo era Satoshi Nakamoto. A figura misteriosa lançou o conceito em 2008, ajudou a implementá-lo, e desapareceu da Internet em 2011.

Sua proposta originou a primeira entre 1.358 unidades monetárias digitais, todas unidas pelo mesmo objetivo: o de usar a Internet para desviar de qualquer tipo de controle monetário governamental.

Há duas características fundamentais que garantem esse objetivo: primeiro, a não-existência de manifestação física dessas moedas; segundo, a natureza criptográfica de todas as transações.

O que valida a existência da moeda é uma gigantesca planilha que detém o conjunto de todas as operações já feitas, que é constantemente atualizada por milhares de servidores anônimos ao redor do mundo. Cada transação só se torna válida depois que cada um desses servidores a autoriza em seu próprio bloco de operações, e o “bloco” é ligado à “corrente” com as informações anteriores.

Daí vem o nome “block chain” (“corrente de blocos”) – bastante óbvio, diga-se de passagem.

Esse desenho estrutural distribuído confere ao blockchain um poderosíssimo freio contra fraudes, que vem sendo adotado de forma positiva para outros propósitos, como controlar estoques em grandes supermercados, analisar o tráfego e até pelo próprio sistema bancário norte-americano. Mesmo que um servidor tenha seu banco de dados adulterado, milhares de outros o corrigirão instantaneamente.

A parte da “contravenção” a que Stiglitz se refere se dá pela criptografia pesada sobre as informações do blockchain. Depois que um bloco é fechado e assimilado pela rede, uma complexa operação matemática esconde o registro público para sempre. Beira o impossível descobrir quem comprou o quê, e quando.

Do lado do usuário, a segurança contra fraudes se dá pela atribuição de uma chave digital exclusiva, tão complexa que exigiria de supercomputadores semanas de processamento para desvendar.


Nesse ponto mora, simultaneamente a maior virtude e o maior vício das criptomoedas: se por um lado esse sistema evita que o dinheiro virtual seja duplicado, por outro remove qualquer tipo de controle humano sobre o que está acontecendo na planilha. É um terreno fértil para o banditismo. Não à toa, a crescente adoção dessa ferramenta tem sido associada a práticas de lavagem de dinheiro e tráfico de drogas na Deep Web, e foi proibida em países como Coreia do Sul e China.

A automação implacável abrange inclusive a própria geração de novas moedas. Para que novas Bitcoins sejam emitidas, é necessário que um servidor feche um bloco e acrescente-o à corrente. Isso acontece a cada 10 minutos, 24 horas por dia, e garante 12,5 novas moedas à máquina que fechar a operação mais rapidamente. Esse ritmo diminui pela metade a cada 4 anos “para que a moeda possa valorizar”.

Aos derrotados, o sistema confere pequenas taxas de verificação por validar os blocos.

O maior esquema de pirâmide (e a maior bolha) do mundo

Tentar explicar essa gincana matemática é suficiente para confundir qualquer cidadão. E, nessa confusão, os próprios jornalistas acabam perdendo o foco. A grande dúvida hoje, segundo os noticiários, é se o Bitcoin é ou não uma bolha financeira.

A resposta para essa pergunta é SIM.

Nas palavras de outro Prêmio Nobel de Economia, Robert Shiller, “a Bitcoin é neste momento o melhor exemplo [do que deveria ser uma bolha]. Uma grande história com um bom grau de mistério e que se encaixa às agonias de seu tempo, que dá às pessoas um senso de empoderamento diante de um novo mundo digital”.

Por trás do entusiasmo juvenil tão bem descrito por Shiller, esconde-se a pergunta que os economistas reais estão se fazendo: POR QUE, afinal, a Bitcoin chegou ao patamar de 17.950 dólares por unidade? Como pode uma moeda se valorizar quase 2.000% em um ano?

Não há como dourar a pílula – uma criptomoeda não representa nada, não tem endereço físico, não tem autoridade nenhuma sustentando seu valor, não é regulamentada. Não há como comprar um pão ou encher o tanque com ela. Não há valor subjacente, não há forma de controle.

A valorização só decorre, portanto, da própria adoção da Bitcoin, que é motivada pela expectativa de que ela se valorize ainda mais. Foi essa observação que levou o presidente do Banco Central do Brasil, Ilan Goldfajn, a chamar a moeda de “esquema de pirâmide” na última quarta-feira (13).

Não é exagero. Criptomoedas não têm qualquer liquidez. A única forma de uma pessoa recuperar o investimento é convencer outra pessoa a comprar sua moeda com dinheiro real. Nesse sentido, Bitcoins não são diferentes de caixas de suplemento alimentar ou de produtos de beleza que acabam encalhados nas garagens dos desavisados. É um produto indesejado, cujo valor está exclusivamente na projeção de valorização no ato de venda.

O caráter de pirâmide fica evidente nas interações dentro das comunidades que hoje debatem as criptomoedas pela Internet. Nos sites especializados, há um fanatismo quanto às benesses da Bitcoin que beira o culto religioso. Qualquer questionamento é recebido com agressividade, pois, como já houve um investimento monetário real por parte dos participantes, críticas são vistas como ameaças à realização do lucro.

A comparação com o mercado de ações, muitas vezes utilizada pelos defensores das moedas virtuais, carregam uma falha fundamental: ao contrário de empresas reais, que participam da atividade econômica e estão integradas na matriz produtiva de um país, uma criptomoeda existe exclusivamente em caráter simbólico.

Falar de crimes virtuais e perdas pessoais dos envolvidos com as criptomoedas, entretanto, é apenas o aspecto imediato dessa discussão. Há uma face mais profunda e muito mais perigosa em toda essa história, que é a perda de controle monetário por parte dos governos.

Vale retomar a proposta inicial da Bitcoin: uma moeda acima de qualquer ente regulatório. Esse ideal ultraliberal nasce de uma concepção infantil de economia, que vê na interferência dos bancos centrais a causa das crises econômicas. Para Satoshi Nakamoto, em seu artigo de origem da moeda, a grande panaceia seria a eliminação completa do ser humano das decisões monetárias, substituído por um protocolo fora de contato com a realidade.

É apenas uma reembalagem do conceito surrado do “livre mercado”, portanto – algo que já deveria estar morto depois de 2008, quando justamente a ausência de regulamentos disparou a maior crise econômica da qual se tem notícia.

Ao vincular a criação de novas moedas com o fechamento dos blocos, a Bitcoin tenta forçar um controle que separa o dinheiro da economia real que ele deveria representar.

O que é o dinheiro, afinal? Apenas uma ferramenta para distribuir a produção de um país, nada mais. O que dá valor às cédulas e números bancários no Brasil, na China ou em qualquer outro lugar não é a quantidade de moedas disponível, e sim a equivalência entre ela e o PIB.

Tentar engessar matematicamente a emissão de novas moedas até o ano 2140, como propõe o protocolo Bitcoin, é de uma arrogância inacreditável. Há uma infinidade de fatores que interferem a todo momento no volume de moedas que um país deveria ter – daí a necessidade de bancos centrais, e comitês monetários, e reuniões intermináveis com linguagem chata.

Pior ainda: conforme a produção de Bitcoins cair, como planejado, haverá um abismo crescente entre a quantidade de moedas disponíveis e o valor que elas deveriam representar. Isso forçará as pessoas a fracionarem cada vez mais as moedas, diminuindo o preço dos produtos por pura escassez monetária e induzindo um quadro deflacionário preocupante.

Em um quadro de deflação, há uma tripla tragédia sobre o trabalhadores: primeiro, as empresas perdem receita; depois, acabam demitindo parte de seus funcionários para não entrarem no vermelho; com isso, diminuem a capacidade geral de consumo, forçando os preços gerais ainda mais para baixo. E começa de novo o ciclo.

Do outro lado, os ricos recebem incentivo real para deixar dinheiro parado. Como a mesma moeda vale cada vez mais com o tempo, faz mais sentido guardá-las debaixo do colchão do que empregá-las em alguma coisa. A concentração primitiva vira regra.

Em meio a tudo isso, os governos estariam acorrentados pelo protocolo monetário do blockchain. Quanto mais pessoas aderissem às criptomoedas, mais refém estaria o conjunto da sociedade diante do protocolo automatizado, que só pode ser alterado se o conjunto dos maiores servidores votar em massa pela alteração do código-fonte – coisa que, em um cenário deflacionário, jamais fariam, pois perderiam muito dinheiro.

Talvez esse seja o aspecto mais perverso dessa situação-limite: os donos dos servidores se tornariam donos da economia. As interferências desse pequeno clube se disfarçariam de tecnicalidades, e o resultado seria uma concentração de renda brutal.

Uma briga que vai longe

Há ainda muitos problemas que poderiam ser colocados contra a Bitcoin, e que ainda carregarão essa discussão por muito tempo. É preciso questionar a hiperconcentração de servidores nas mãos de pouquíssimos grupos chineses, assim como as recorrentes brigas que acabam na criação de moedas paralelas e o caráter autoritário de distribuir as novas moedas para quem já tem máquinas poderosas.

É fundamental corrigir o baixíssimo limite de transações por segundo da rede, e regular os preços cada vez mais altos cobrados para operar cada transação. Isso sem falar no consumo de eletricidade estratosférico associado à “mineração” de novas moedas, que já supera o de 159 países e não para de crescer.

São muitos problemas. E não há sinal de resolução.

O que impressiona, diante desse quadro, é assistir ao Jornal Nacional repetir, cada dia mais seguro, que a Bitcoin “é uma forma de investimento que está ganhando o mundo”, mesmo com a profusão de armadilhas espalhadas pelo caminho.

Não podemos continuar fingindo que as criptomoedas não terão consequências reais. A discussão não pode estar limitada a uma brincadeira de cassino.





Fonte: RENATO BAZAN/DCM