A guerra na Síria completou no dia 15 de março quatro anos e sem uma perspectiva de fim, com um balanço humanitário dramático, um regime cada vez mais apegado ao poder e uma comunidade internacional preocupada, especialmente, com as atrocidades do grupo jihadista Estado Islâmico (EI).
As organizações internacionais condenaram o fracasso dos governos de todo o mundo para encontrar uma solução à guerra, que segundo a ONG Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH) provocou mais de 215.000 mortes, em uma estimativa conservadora.
Além disso, a batalha forçou metade da população síria a abandonar suas casas.
A imagem das manifestações pacíficas iniciadas em 15 de março de 2011 desapareceu há muito tempo.
A revolta popular contra o regime ganhou um caráter militar ante a repressão do governo até virar uma guerra civil complexa, na qual se enfrentam tropas leais ao regime, vários grupos rebeldes, forças curdas e organizações jihadistas.
A diplomacia está bloqueada, após duas séries de negociações em vão entre o regime e a oposição. Dois enviados especiais jogaram a toalha e um terceiro tentou obter a aplicação, sem sucesso, de uma suspensão dos combates em Aleppo.
Pelo menos 26 pessoas morreram e mais de 100 ficaram feridas em ataques aéreos do regime sírio perto de Damasco.
Os ataques aconteceram na cidade de Duma, ao nordeste da capital.
O OSDH afirmou que os aviões do governo executaram quatro ataques em Duma e que entre os feridos estão mulheres e crianças. A ONG advertiu que o balanço de mortos pode aumentar porque há feridos em estado grave.
Duma fica em Guta Oriental, reduto opositor e alvo de grandes ataques aéreos do governo há vários meses, enquanto os rebeldes disparam mísseis a partir desta cidade contra Damasco.
Mudança perigosa
A incapacidade da comunidade internacional para acabar com a violência alimenta o sentimento de amargura e abandono dos sírios, que enfrentam, segundo a ONU, "a situação mais importante de emergência humanitária de nossa era".
Quase quatro milhões de pessoas fugiram da Síria, incluindo um milhão que buscara refúgio no vizinho Líbano.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) advertiu para a "mudança perigosa" na crise, já que dois milhões de sírios com menos de 18 anos podem virar uma "geração perdida".
No país, mais de sete milhões de sírios abandonaram suas casas e quase 60% da população vive na pobreza.
Os combates destruíram as infraestruturas e, com isto, provocaram uma grande escassez de energia elétrica, água e alimentos, especialmente nas zonas cercadas pelo exército.
As organizações de defesa dos direitos humanos investigaram as atrocidades cometidas pelo regime sírio de Bashar al-Assad.
Mais de 13 mil sírios morreram torturados nas prisões desde o início da revolta popular e outras dezenas de milhares continuam nas penitenciárias do governo, embora muitos deles sejam citados como desaparecidos.
O OSDH anunciou um balanço devastador do conflito.
"Contabilizamos 215.518 mortos em quatro anos de guerra, incluindo 66.109 civis", afirmou à AFP Rami Abdel Rahman, diretor do OSDH, que dispõe de uma ampla rede de fontes na Síria.
Entre as vítimas civis, 10.808 eram crianças.
Mais de 5 mil pessoas morreram no país desde fevereiro, segundo Rahman.
O balanço, destacou Abdel Rahman, "é certamente superior aos 215 mil mortos contabilizados, pelo grande número de desaparecidos com paradeiro ignorado".
Ele também disse que é necessário acrescentar as 20 mil pessoas que estão nas prisões do regime e são consideradas desaparecidas.
Também são ignorados os destinos de milhares de civis e combatentes que foram sequestrados.
"O número supera 215 mil mortos, enquanto a comunidade internacional permanece em silêncio e nenhum tribunal internacional pune estes crimes", denuncia Rami Abdel Rahman.
"A impunidade estimula o assassino a continuar com seus crimes", completou.
"O povo sírio se levantou em março de 2011 para conquistar um Estado de direito e a liberdade, e não para passar da opressão da ditadura à opressão do grupo Estado Islâmico", concluiu.
Assad apegado ao poder
Apesar da indignação internacional com o número de vítimas e o suposto uso de armas químicas pelo regime em meados de 2013, Bashar al-Assad continua fixado ao poder, ainda mais quando suas forças consolidam a presença na periferia de Damasco e Aleppo em detrimento da rebelião.
Diante dos rebeldes, o exército destaca sua superioridade militar, reforçada com combatentes estrangeiros, como os do Hezbollah libanês. Apesar das provas apresentadas por ONGs, Assad nega o uso de barris de explosivos.
Os países ocidentais, que exigiam a saída de Assad em 2011, se tornaram menos veementes após o surgimento do grupo Estado Islâmico, considerado atualmente a organização terrorista mais perigosa e melhor financiada do mundo. O secretário de Estado americano, John Kerry, destacou recentemente que a prioridade de Washington é vencer os jihadistas.
Mas Kerry admitiu que o governo dos Estados Unidos terá que negociar com o presidente da Síria, Bashar al-Assad, para acabar com a guerra civil neste país.
"Ao final teremos que negociar. Sempre estivemos dispostos a negociar dentro do processo (de paz) de Genebra I", disse Kerry em uma entrevista exibida pelo canal CBS.
Ele destacou que Washington trabalha sem descanso para reativar os esforços para encontrar uma solução política para acabar com a guerra.
O governo americano liderou os esforços internacionais para iniciar os diálogos de paz entre Assad e uma fragmentada oposição síria, aproximando as partes pela primeira vez em uma reunião em Genebra no ano passado.
Mas após duas séries de debates, as negociações afundaram sem a programação de novos encontros, enquanto aumenta o número de mortes no conflito.
"Assad não queria negociar", disse Kerry à CBS.
"Mas se estiver preparado para iniciar uma negociação séria sobre a implementação de Genebra I, com certeza (...) e o que estamos tentando obter é que venha e faça isto", respondeu ao ser questionado se negociaria com Assad.
Poucas esperanças de paz
Desde meados de 2014, Washington lidera uma coalizão internacional contra o EI no Iraque e na Síria, onde os jihadistas proclamaram um califado nos territórios sob seu controle.
Os bombardeios aéreos permitiram às forças curdas expulsar os jihadistas de algumas áreas ao norte da Síria, mas o EI mantém sua força, como demonstram os vídeos divulgados de decapitações de civis, jornalistas e voluntários.
O grupo extremista sunita atrai milhares de combatentes estrangeiros, incluindo muitos ocidentais, o que aumenta o temor de possíveis ataques jihadistas após o retorno a seus países de origem.
As esperanças de paz na Síria são cada vez menores, mas uma nova rodada de negociações, com resultado incerto, está prevista para este mês de abril, em Moscou, entre enviados de Damasco e uma delegação da oposição.
Da France Presse/Globo
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