segunda-feira, 17 de março de 2014

Black Blocs! Erros e Acertos!



O acerto dos black blocs foi no diagnóstico que eles fizeram: sim, é verdade que há uma crise de representatividade do estado. É verdade também que nossos governantes em todos os níveis estão carecendo de legitimidade. É verdade sim que nossa democracia está manca.

 É verdade que uma dúzia de financiadores de campanha controlam as eleições, doando para praticamente todos os candidatos, e que boa parte dos partidos, do PT ao PSDB, no fundo trabalham para os mesmos patrões. É verdade também que nossa polícia está numa crise moral, diante da constatação de que ela está cheia de assassinos e de corruptos, e que essa crise moral abala sua autoridade.

 Que os serviços públicos – transporte, educação, saúde – não prestam. E é claramente verdade que a Copa foi sequestrada por interesses privados bancados a dinheiro público.
Tudo isso é verdade.

Já o erro dos black blocs foi a estratégia. Não quero ficar discutindo aqui se o uso da violência é ou não moral. Afinal, moral é que nem bunda, cada um tem a sua. Mas, independente da validade moral, é uma tática ruim quando o objetivo é ganhar o apoio da população. Usar violência para conseguir algo que depende da simpatia dos outros não funciona, simples assim. Ainda mais neste mundo de hoje, hiperconectado. Ninguém ganha a opinião pública explodindo coisas.

Essa foi a maior lição da luta por direitos civis nos Estados Unidos dos anos 60, liderada por Martin Luther King Jr. A sacada de King para expor o absurdo do apartheid americano foi usar a tática da “não-violência”, inspirada pela luta da independência da Índia contra os colonizadores britânicos (e pela resistência de Cristo ao Império Romano).

“Não-violência” é bem diferente de “pacifismo”. Pacifismo significa ser contra a guerra – qualquer guerra, em qualquer momento. Já não-violência é uma estratégia de luta: significa resistir, recusar-se a colaborar, mas jamais reagir violentamente contra um adversário mais forte e errado. Essa estratégia é dificílima de implementar, porque não é fácil controlar os ânimos de multidões, ainda mais debaixo de cacetada. Mas os resultados são fantásticos: a resistência não-violenta expõe o agressor ao ridículo e conquista muito rápido o apoio do povo.



Foi o que os manifestantes de São Paulo fizeram na quinta-feira, 13 de junho de 2013, quando uma pequena manifestação pacífica foi truculentamente esmagada por uma polícia despreparada comandada por políticos sem noção. As autoridades se saíram tão mal naquele dia que, na segunda-feira seguinte, dia 17, o Brasil inteiro foi às ruas em apoio.

Nos meses que se seguiram, inspirados por um diagnóstico correto, os black blocs foram dominando as manifestações com uma estratégia errada, determinados a usar a força para combater aqueles que eles consideram seus inimigos: a polícia, os políticos, a mídia tradicional. Essa estratégia não tinha chance de dar certo por dois motivos: 1) eles jamais serão capazes de derrotar o estado pela força e 2) ao tentar isso, eles desmobilizaram o grosso da população e tornaram-se presas fáceis de um contra-ataque baseado na destruição de suas reputações.

Jamais os black blocs deveriam ter saído mascarados às ruas – a opinião pública nunca irá apoiar quem não mostra a cara. Jamais eles deveriam ter permitido depredações ou atos violentos – com isso eles atraíram “apoiadores” que só queriam brigar e quebrar, ou seja, o pior tipo de aliado.

O resultado é um impasse, que deixa o Brasil num suspense angustiante. Oito meses depois do início das manifestações, o cenário moral do Brasil é de terra arrasada. Não sobrou quase nada em pé. Os manifestantes são vistos como irresponsáveis e violentos. A polícia revelou-se despreparada e incapaz de fazer seu trabalho (proteger os cidadãos).

 A reputação dos políticos está abaixo da das baratas e dos piolhos. Vários personagens da mídia comprometeram sua credibilidade ao entrar no confronto e faltar com a verdade em algumas ocasiões. O governo está perdido, e a oposição não tem respostas. A opinião pública está raivosamente dividida e todo mundo está xingando todo mundo de imbecil no Facebook.

Estamos num beco sem saída. Só fico torcendo para que a desconfiança generalizada e o ódio que dominou tudo não nos desviem daquela necessidade primeira, a que começou tudo: a necessidade de mudar. Não falo de mudar o partido que está no poder. Falo em mudar a forma de conceber e de dividir o poder. As lideranças capazes de mudar tudo – a política, os partidos, o governo, a polícia, os negócios, a mídia, as ruas – existem. Agora elas precisam aparecer e apontar o caminho para fora dessa crise generalizada. De cara aberta.



Fonte: Denis Russo Burgierman/Super.



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