quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Petrobras - Poluindo Nossos Mares! parte 1.



Continua a poluição na baia de Guanabara

Investigação da polícia federal descobre que a empresa despeja no mar, sem tratamento, resíduos tóxicos – dejetos da exploração do petróleo.



Na tarde de 30 de agosto de 2011, três botes da Polícia Federal (PF) deixaram a Marina da Glória, no Rio de Janeiro, rumo à Refinaria de Duque de Caxias, a Reduc, a quarta maior da Petrobras. Os botes singravam as águas do Rio Iguaçu quando, súbito, depararam com boias laranja impedindo a passagem. A água escurecida reluzia óleo. O rio estava tomado por uma língua negra de poluição, que se espalhava pela Baía de Guanabara – perto dali, ela tinha profundidade de 2 palmos. “Parece uma privada!”, disse um agente da PF. Os policiais retiraram as boias, esperaram a maré subir e chegaram às margens da Reduc, onde funcionários aguardavam-nos. A PF, comandada pelo delegado Fábio Scliar, chefe da Divisão de Crimes Ambientais no Rio de Janeiro, investigava por que a Petrobras descartava poluentes diretamente nas águas do Iguaçu e na vegetação da área. Era o início de um processo criminal que culminou, há dois meses, no indiciamento de dois gerentes da Petrobras por crime de poluição – e na descoberta, segundo a PF e o Ministério Público Federal, da negligência da Petrobras ao descartar o principal subproduto poluente da extração do petróleo, a “água negra”.

A blitz na Petrobras começara às 7 horas daquele dia, quando peritos do Instituto Estadual do Ambiente (Inea), órgão subordinado ao governo do Rio, sobrevoaram de helicóptero a Reduc e constataram a mancha de óleo. Três horas depois, os peritos visitaram a refinaria. Percorreram, acompanhados de funcionários da Petrobras, as margens do rio. Perto de um dos pontos onde eles haviam avistado as manchas de óleo, uma placa dizia: “Interditada”. Os gerentes da Petrobras insistiram que os fiscais não atravessassem a área, embora não explicassem por quê. Os fiscais foram assim mesmo. Encontraram uma operação de emergência da Petrobras, montada para retirar a poluição do local – e, segundo o MP, encobrir o crime. Havia caminhões de sucção de óleo, barreiras, funcionários correndo para lá e para cá. “Presenciamos as tentativas, a todo o custo, de conter a grande quantidade de óleo ainda retido ali”, escreveram os peritos. “Os funcionários que nos atenderam negaram até a derradeira descoberta do vazamento.”

Nas águas que margeiam a Reduc, na vegetação contígua e no manguezal que (ainda) existe no terreno da refinaria, os fiscais descobriram grandes quantidades de óleo. Parte já estava havia tanto tempo no local que apresentava a aparência de “chocolate cupcake”, apelido desse detrito – as fotos mostram que o manguezal de 353 hectares parecia um bolo mofado. Óleo novinho, misturado a dezenas de poluentes, era lançado ao rio durante a vistoria dos fiscais. Vazava dos dutos da estação de tratamento de detritos. Em vez de limpar, a estação sujava. Como escreveram os investigadores, “parecia um filme de terror”.
As substâncias coletadas pelos fiscais mostraram-se altamente tóxicas. Havia níveis de óleo, graxas e fenóis “muito acima” dos limites legais. A origem dos detritos era o petróleo da refinaria.

 Como resultado, o Inea multou a Petrobras em R$ 3,3 milhões. Depois, fechou acordo com a empresa. A Petrobras prometeu construir uma nova estação de tratamento na Reduc – até 2017. Prevê-se, nas palavras da Petrobras, um “investimento conceitual” de R$ 1 bilhão para modernizar a limpeza de poluentes como a água negra. Em 7 de novembro do ano passado, após o acordo, os fiscais voltaram à Reduc. Coletaram novamente a água negra despejada no Rio Iguaçu. Verificaram que havia toda sorte de poluente, a maioria acima dos limites legais, um com nome mais apavorante que outro: óleos, graxas, sólidos sedimentáveis, fenóis, nitrogênio amoniacal. Emitiram um novo alerta à Petrobras.


 Resultado da Poluição

Ao ouvir os responsáveis pela poluição na Reduc, o delegado Scliar foi informado de que havia um desastre ambiental em curso: o descarte da água de produção nas plataformas de petróleo. A água de produção, ou água negra, é um subproduto da prospecção de petróleo. O produto final é, basicamente, água do mar misturada com óleo, graxa e várias substâncias tóxicas. A lista das substâncias parece uma viagem à tabela periódica. Estão lá metais como bário, berílio, cádmio, cobre, ferro, além de elementos radioativos. Ao cair no mar sem tratamento, é um perigo para a vida aquática. A denúncia que chegou a Scliar afirmava que a Petrobras não tratava a água negra, nas plataformas ou em terra, como manda a lei. Scliar e sua equipe passaram a rastrear o destino da água negra. Nas plataformas, seria impossível fiscalizar. Mas, como a Petrobras afirma enviar 1% dela a terminais em terra, ele passou a ouvir os encarregados de tratá-la. No Rio, a primeira escala da água negra em terra são os terminais de Ilha Grande e de Cabiúnas.

No papel, uma das funções dos terminais de Ilha Grande e de Cabiúnas é “retirar o máximo possível” da água negra que lá chega misturada ao petróleo extraído das plataformas. Desses dois terminais, o óleo segue para as refinarias. Quanto mais puro chegar a elas, menor o custo de produção da Petrobras – e, potencialmente, maior o lucro. Como elas armazenam petróleo e água negra nos mesmos tanques, a água negra apenas ocupa o espaço que deveria ser do petróleo. Portanto, quanto mais água negra misturada aos tanques, menor a capacidade de produção da refinaria. De modo que empresas como a Petrobras têm todo o incentivo para se livrar dela sem o devido cuidado.

A mesma lógica aplica-se à exploração de petróleo em outras costas. Nos Estados Unidos e na Austrália, os limites para o descarte de água negra são similares aos do Brasil. Mas lá, ao contrário do que ocorre aqui, há fiscalização. Na Noruega, um dos maiores produtores de petróleo do mundo, a conversa é diferente: persegue-se a meta de “poluição zero” no descarte de água negra – meta já cumprida nas plataformas mais modernas, que dispõem de tecnologia para limpar e reaproveitar poluentes. A Inglaterra adotou a mesma filosofia.


Na prática nada é tratado.

Na prática, de acordo com os depoimentos dos funcionários da Petrobras, nada é tratado nos terminais de Cabiúnas e de Ilha Grande. O gerente de Cabiúnas, Paulo Nolasco Barreto, disse ao delegado Scliar que o terminal “não possui estação de tratamento de efluentes”. Há uma estação antiga e desativada, segundo ele, “inoperante há cerca de seis ou sete anos”. O gerente do terminal de Ilha Grande, Virmar Muzitano, contou a mesma coisa a Scliar: o Terminal de Ilha Grande também não trata a água negra. Até existia uma estação em Ilha Grande, como em Cabiúnas, mas, de acordo com Muzitano, ela foi desativada por “ter ficado obsoleta”. Ambos afirmaram que a Petrobras “planeja” construir novas estações. “Se existia estação de tratamento nesses terminais, é porque há alguma coisa a tratar. Por que deixaram chegar a esse ponto?”, diz Scliar. Ninguém na Petrobras soube responder a ele. Flávio Santos de Araújo, gerente executivo da Petrobras na área de meio ambiente, disse em depoimento não saber que as estações de tratamento de dois dos principais terminais da Petrobras estão desativadas: “São tantas as unidades da Petrobras no âmbito (dele) que não há como conhecer essas informações”.

Fonte: Revista Época/

DIEGO ESCOSTEGUY COM MARCELO ROCHA, MURILO RAMOS E LEANDRO LOYOLA

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